A rapidez com que a crise fiscal se agrava pode ser vista nos números divulgados pelo próprio governo federal. Em apenas dois meses, as projeções deste ano passaram de um superávit primário de 14,6 bilhões de reais para um déficit de 51,7 bilhões. O primeiro número consta na Lei Orçamentária de 2025 aprovada no fim de março. Já o segundo está no relatório de avaliação de receitas e despesas primárias do segundo bimestre, divulgado pelos ministérios da Fazenda e do Planejamento em maio.
Independentemente da coloração ideológico-partidária de quem ocupa o Palácio do Planalto, os presidentes brasileiros consolidaram uma prática de majorar as estimativas de receitas e reduzir as de despesas, aprovando no Congresso peças orçamentárias que pouco refletem a realidade. Desta vez, contudo, a velocidade com que o cenário passou de positivo para negativo impressiona.
Em apenas dois meses, o governo cortou as projeções de receitas líquidas deste ano em quase 42 bilhões de reais, reduzindo-as de 2,36 trilhões para 2,32 trilhões entre o Orçamento aprovado e a revisão de maio. Ao mesmo tempo, a previsão das despesas primárias aumentou cerca de 26 bilhões de reais, puxada pelo acréscimo de 36 bilhões nos gastos obrigatórios. Para compensá-los, a revisão da equipe econômica cortou a estimativa de gastos discricionários em cerca de 10 bilhões de reais.
O corte pode soar como uma medida de austeridade fiscal, mas as despesas discricionárias representam a margem de manobra do governo para alocar recursos em investimentos, além de itens de custeio da máquina pública como o pagamento das contas de energia elétrica dos prédios públicos. Por isso, os especialistas em orçamento público afirmam que o ideal é o contrário: promover a redução dos gastos obrigatórios para que sobre mais dinheiro para investimentos e outras destinações.
O agravamento da crise fiscal domina as articulações políticas em Brasília. Em 22 de maio, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, anunciaram um congelamento de despesas de 31 bilhões de reais, a fim de cumprir a meta fiscal deste ano. O que fez fez políticos, empresários e o mercado financeiro perderem a paciência, contudo, foi a decisão do governo de elevar as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Sob o pretexto de que a decisão era apenas um ajuste para equalizar as várias alíquotas em uma só de 3,5%, a medida foi vista como arrecadatória – algo admitido pelo próprio governo, que espera faturar pelo menos 18 bilhões de reais neste ano com o IOF mais alto.
A medida despertou uma forte rejeição no Congresso. O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que o Brasil não merece mais impostos e deu um prazo de dez dias para que o governo apresente medidas estruturais para sanear os gastos públicos e estabilizar a dívida federal. O pacote foi apresentado por Haddad na última terça-feira 3, durante almoço no Palácio da Alvorada com os presidentes da República, Luiz Inácio Lula da Silva, da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Ficou combinado que as propostas só se tornarão públicas após serem apresentadas aos líderes da Câmara em reunião prevista para o início da noite deste domingo 8. A partir daí, Motta e o colégio de líderes que define a pauta de votação da casa definirão se levarão adiante o projeto de decreto legislativo (PDL) apresentado pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS), líder da oposição. O propósito do PDL é derrubar o aumento do IOF.
Ontem, Motta afirmou a jornalistas que a decisão de pautar a votação do PDL será tomada até a próxima terça-feira 10, após sentir a reação dos líderes da Câmara ao pacote de Haddad. O ministro já afirmou que o governo concorda em rever o aumento do IOF, desde que haja sinais claros de que o Congresso aprovará pelo menos parte das medidas que sugere ainda este ano.