Mesmo sem Trump, estados dos EUA mantêm foco climático

Mesmo sem Trump, estados dos EUA mantêm foco climático

Artigo Policial

Quando Donald Trump voltou ao poder, em 2025, retomou um discurso já conhecido: minimizar a crise climática, desdenhar do Acordo de Paris e reforçar uma agenda de expansão fóssil. Mas a política climática dos EUA nunca se limitou à Casa Branca. Sob a liderança de estados como a Califórnia, boa parte do país mantém compromissos ambiciosos de descarbonização, criando uma espécie de contranarrativa ambiental à retórica federal. Essa autonomia estadual é histórica. Desde os anos 2000, a Califórnia desenvolveu um dos sistemas de comércio de emissões mais robustos do mundo, vinculado ao mercado de Quebec, e tornou-se referência global em eficiência energética e transportes de baixa emissão. Hoje, mais de um terço da eletricidade consumida no estado já vem de fontes renováveis — resultado de políticas locais que não recuam, mesmo quando a esfera federal tenta desmontar regulações ambientais. É nesse contexto que se insere o acordo assinado em setembro entre Brasil e Califórnia, durante a Climate Week de Nova York. O memorando de entendimento prevê cooperação em cinco frentes: mercados de carbono de alta integridade, expansão de veículos de emissão zero, transição energética, soluções baseadas na natureza e monitoramento da qualidade do ar. Trata-se de um pacote de medidas que reforça a convergência entre agendas subnacionais e a diplomacia brasileira.

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A importância vai além do simbolismo. A Califórnia acaba de estender seu programa de “cap-and-invest” até 2045, garantindo bilhões de dólares para financiar inovação climática e justiça ambiental. Isso significa que qualquer parceria com o estado abre portas concretas para investimentos, transferência tecnológica e padrões regulatórios que podem moldar mercados. Para o Brasil, especialmente em áreas como a bioeconomia da Amazon e o desenvolvimento de uma indústria de baixo carbono, essa conexão é estratégica. Estados americanos que concentram parte significativa da população e do PIB nacional continuam avançando em direção oposta. Essa dualidade mostra duas Américas: a de Washington, que recua, e a de Sacramento, que acelera a transição. Mais do que um detalhe diplomático, o acordo Brasil-Califórnia simboliza uma tendência global: a ação climática não está mais restrita aos governos centrais. Cidades, estados e empresas vêm assumindo compromissos que, na prática, asseguram continuidade mesmo diante de retrocessos políticos. Isso garante uma certa resiliência à agenda climática internacional, mas também expõe o impasse: até que ponto essas iniciativas locais compensam a ausência de liderança federal?

Para o Brasil, a lição é clara. Ao articular-se com atores subnacionais poderosos, o país não apenas amplia sua rede de cooperação, mas também sinaliza ao mercado que está disposto a alinhar-se aos padrões mais avançados de governança climática. Essa é uma forma de escapar da paralisia geopolítica e, ao mesmo tempo, reposicionar-se como ator relevante na corrida pela descarbonização. Em um mundo cada vez mais marcado por retrocessos no plano global, alianças como essa mostram que a luta climática sobrevive e avança em múltiplos níveis de governança. O futuro da ação climática pode não estar apenas nas conferências da ONU ou nas decisões de presidentes, mas na persistência de estados e sociedades que se recusam a esperar.

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