Israel lançou uma invasão terrestre à Cidade de Gaza na madrugada desta terça-feira, 16, cumprindo uma ameaça feita há meses. Segundo as Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês), esta é a “fase principal” da ofensiva. A manobra para assumir o controle de uma área urbana crucial é arriscada, uma vez que centenas de milhares de palestinos continuam morando lá.
Na manhã desta terça-feira, o Exército israelense informou que três divisões de soldados da ativa e da reserva iniciaram “operações terrestres expandidas na Cidade de Gaza” para atacar o Hamas.
“As IDF começaram a desmantelar a infraestrutura terrorista do Hamas na Cidade de Gaza”, declarou nas redes sociais o porta-voz em árabe do Exército israelense, Avichay Adraee. “A Cidade de Gaza é uma zona de combate perigosa. Permanecer na cidade coloca você em perigo.”
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, confirmou nesta terça que “uma poderosa operação em Gaza” começou durante a madrugada, acrescentando que “Israel está em um estágio crucial”.
Mais de vinte mortos e dezenas de feridos foram levados ao hospital Al-Shifa, importante centro médico na Cidade de Gaza, nas últimas horas, informou Mohammad Abu Salmiya, diretor da unidade. Zaher al-Waheidi, funcionário do Ministério da Saúde de Gaza, confirmou que o hospital relatou ter recebido mais de 20 corpos desde a meia-noite. Autoridades locais de saúde dizem que ambulâncias e equipes de emergência não conseguem socorrer os feridos presos nas ruas ou sob os escombros.
A operação terrestre e a intensificação dos bombardeios israelenses devem agravar a já calamitosa crise humanitária em Gaza. A guerra já matou mais de 63 mil palestinos, deslocou quase toda a população de suas casas, destruiu mais de 80% dos prédios e construções, e criou uma situação generalizada de fome no território, segundo a ONU.
De acordo com as IDF, a invasão terrestre será uma “manobra coordenada e gradual”, que combinará informações precisas da inteligência israelense com soldados no solo e a Forças Aérea, para “desmantelar o reduto central do Hamas e seu domínio da área”. Os militares israelenses disseram que espera-se encontrar até 3 mil combatentes do grupo e de outras facções aliadas na Cidade de Gaza.
A operação vinha se intensificando há semanas, com ordens de retirada para toda a população da cidade (composta, em grande parte, de refugiados de outras áreas destruídas do enclave) e ataques aéreos diários. As IDF acreditam que 40% da população estimada em 1 milhão de habitantes da Cidade de Gaza e arredores já deixaram o local, e alertaram quem permaneceu para fugir em direção ao sul.
Tel Aviv justifica que a tomada da cidade é necessária para impedir que o Hamas se reagrupe e planeje futuros ataques, como o que atingiu o país em 7 de outubro de 2023, dando início à guerra com a execução de 1.200 israelenses e sequestro de mais de 250. Os planos, porém, atraíram críticas contumazes por parte da comunidade internacional e reduziram as esperanças de um acordo de cessar-fogo com o Hamas, defendido por muitas autoridades dentro e fora de Israel como a melhor forma de libertar os reféns em posse do grupo e encerrar a guerra.
A ofensiva terrestre foi lançada imediatamente após uma visita de dois dias do secretário de Estado americano, Marco Rubio, ao país. Ele voltou a prometer apoio “inabalável” dos Estados Unidos a Israel, o que foi interpretado como um sinal verde do presidente Donald Trump para a operação. O líder republicano, inclusive, foi às redes sociais na noite de segunda-feira para espalhar uma notícia não confirmada de que o Hamas havia levado alguns dos cerca de 20 reféns israelenses ainda vivos para as ruas da Cidade de Gaza para servirem como escudos humanos.
Acusações de genocídio
O ataque terrestre foi lançado na mesma manhã em que um painel de especialistas em direitos humanos da ONU publicou um relatório acusando Israel de cometer genocídio.
“Está claro que há a intenção de destruir os palestinos em Gaza por meio de atos que atendem aos critérios estabelecidos na Convenção sobre Genocídio”, disse Navi Pillay, presidente da comissão de inquérito das Nações Unidas sobre os territórios palestinos ocupados e Israel.
O Ministério das Relações Exteriores israelense rejeitou o relatório da comissão como “distorcido e falso”. Israel Katz, o ministro da Defesa, declarou em uma publicação no X (ex-Twitter): “Gaza está em chamas. As IDF estão atacando a infraestrutura terrorista com punho de ferro. Não desistiremos até que a missão seja concluída.”
O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Turk, demandou que Israel que interrompa imediatamente o ataque terrestre à Cidade de Gaza, afirmando que as evidências de crimes de guerra, crimes contra a humanidade e possivelmente outros crimes estão se acumulando.
“Só consigo pensar no que significa para as mulheres, para as crianças desnutridas, para as pessoas com deficiência, se forem novamente atacadas dessa forma. E devo dizer que a única resposta a isso é: pare com a carnificina”, declarou Turk a repórteres em Genebra.