A exigência do descanso de 11 horas ininterrupto a cada 24 horas de jornada está dividindo opiniões no setor de transporte rodoviário. A regra, defendida como essencial para preservar a saúde e a segurança dos motoristas, enfrenta críticas por não considerar a escassez de pontos seguros e adequados para paradas.
O debate ganhou força após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, em março de 2025, que o descanso deve ser contínuo — e não mais fracionado. A medida alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), intensificando a fiscalização da chamada “Lei do Descanso”.
Descanso de 11 horas: fiscalização mais rigorosa
De janeiro a março deste ano, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) realizou quase 10 mil fiscalizações e aplicou mais de 31 mil multas por descumprimento da norma — número superior ao registrado no mesmo período de 2024.
Segundo o diretor-geral da PRF, Antonio Fernando Oliveira, o objetivo é prevenir acidentes causados por fadiga. Mas, para cumprir a lei, muitos motoristas precisam parar em locais improvisados, sem segurança ou estrutura.
Descanso de 11 horas: proposta de mudança
No Senado, a PEC 22/2025 busca flexibilizar as regras:
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Suspender multas onde não há Ponto de Parada e Descanso (PPD) adequado.
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Reduzir o descanso obrigatório de 11 para 8 horas, em trechos sem estrutura.
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Permitir o fracionamento das últimas 3 horas até que haja PPDs suficientes.
Atualmente, o Brasil tem cerca de 2,6 milhões de veículos de carga e apenas 14.400 vagas de estacionamento certificadas. A média é de um ponto de parada a cada 9.239 km de rodovia — muito distante da distância máxima de 400 km prevista em portaria do Ministério dos Transportes.
Descanso de 11 horas: o que dizem os especialistas
Para Narciso Figueiroa Júnior, da NTC & Logistics, a exigência de 11 horas foi adotada sem estudo específico para o transporte rodoviário.
“Não há discussão sobre a necessidade do descanso, mas é preciso avaliar quantas horas realmente garantem segurança e se há estrutura para cumpri-las”, afirma.
Diumar Bueno, presidente da CNTA, defende que a lei volte a permitir o fracionamento do descanso e que a fiscalização considere a realidade das estradas. “O caminhoneiro quer descansar com segurança. O problema é quando a lei obriga, mas não oferece condições para cumprir”, pontua.
Pesquisas apontam que dormir menos de 5 horas aumenta drasticamente o risco de acidentes, mas o consenso técnico gira em torno de 8 horas de sono como suficientes para restaurar a atenção e a capacidade de direção.
Descanso de 11 horas: visão dos motoristas
Caminhoneiros como Luciano Cândido (Formiga/MG) e Antônio Marcos dos Santos (Sorocaba/SP) concordam que o descanso é essencial, mas consideram o período de 11 horas excessivo.
Entre as queixas, estão:
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Falta de vagas nos postos.
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Cobrança para pernoite.
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Paradas forçadas pouco antes de chegar em casa.
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Perda de faturamento para motoristas que ganham por comissão ou têm prestações do caminhão.
Iniciativas privadas
Algumas concessionárias já investem em infraestrutura para ajudar no cumprimento da lei.
A Arteris, por exemplo, opera PPDs e Áreas de Descanso na BR-101 (SC) e na SP-255 (SP), oferecendo segurança e serviços básicos. O PPD de Palhoça (SC), entregue em 2024, registrou mais de 130 mil atendimentos no primeiro ano e virou referência para a ANTT incluir estruturas semelhantes em novos contratos de concessão.
Resumo do impasse:
A lei das 11 horas nasceu para proteger, mas, sem infraestrutura adequada, acaba trazendo insegurança, prejuízos e atrasos. Entre manter a rigidez da norma ou adaptá-la à realidade das estradas, o consenso no setor é claro: antes de exigir, é preciso oferecer condições para cumprir.
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