Mais que um episódio isolado, o ataque sofrido nesta semana pela ministra Marina Silva não Senado é mais um momento triste de um tipo de violência que ocorre de forma sistemática contra mulheres da política no Poder Legislativo.
O fenômeno, para quem não o conhece, tem nome: manterrupting, termo cunhado para descrever as interrupções feitas por homens quando mulheres estão falando, especialmente em contextos profissionais ou institucionais. Seja de forma discreta ou violenta, ele, na prática, impede que a mulher conclua sua fala e o seu pensamento. Sendo direta: é um ato realizado para abalar o poder de uma mulher na tribuna.
No Brasil, o assunto foi analisado de forma sistemática por mim e Mauricio Izumi no artigo “Gênero, Dinâmicas de Poder Intrapartidárias e Manterrupting no Legislativo”, publicado recentemente na revista Dados. O estudo examinou 70 mil discursos proferidos por senadores e senadoras brasileiros entre 1995 e 2018 em sessões legislativas. Embora os dados mostrem que mulheres são mais interrompidas que homens, os números informam dinâmicas de poder muito interessantes.
Na análise dos discursos, foi possível identificar que essas interrupções ocorrem de forma mais frequente quando a representante ocupa um cargo de líder do seu partido. Isso sugere que as mais interrompidas são justamente aquelas que têm mais poder, afinal, para que disputar com alguém que não simboliza nenhuma ameaça?
O que foi visto apenas como uma interação normal da política, porém, tem efeitos concretos sobre a participação feminina na política. Ao serem interrompidas, mulheres têm menos tempo de fala, menos espaço para argumentar e, consequentemente, menos influência nos rumos dos debates e das decisões. É um silenciamento simbólico e prático, que afasta mulheres do centro do poder.
* Débora Thomé é cientista política, pesquisadora da FGV/Cepesp. Autora de “Mulheres e Poder” (FGV Editora)