Com medo de perder o visto, alunos estrangeiros deletam redes sociais, excluem grupos de Whatsapp e evitam sair de casa – BRAZILIAN PRESS // O maior jornal brasileiro fora do Brasil

Com medo de perder o visto, alunos estrangeiros deletam redes sociais, excluem grupos de Whatsapp e evitam sair de casa – BRAZILIAN PRESS // O maior jornal brasileiro fora do Brasil

Noticias Gerais

Nos últimos meses, estudantes estrangeiros matriculados em renomadas universidades dos Estados Unidos têm enfrentado um cenário marcado por incerteza, medo e autocensura. Segundo apurado pelo Blog do Marcelo, esses alunos, mesmo estando em situação legal no país, adotaram medidas drásticas para se proteger de possíveis represálias políticas ou administrativas promovidas pelo governo Trump.

“É triste pedir para você não colocar meu sobrenome na reportagem. Não estou cometendo um crime”, disse Núbia*, aluna brasileira da Universidade Harvard, ao comentar sobre o temor de retaliações. “Sinto muito, mas é um momento muito delicado, estou numa posição vulnerável. Estou tremendo só de falar sobre isso.”

A “guerra” declarada pelo governo Trump contra instituições como Harvard, Princeton e Columbia intensificou a sensação de insegurança entre os estudantes internacionais. Desde janeiro, quando o republicano assumiu a presidência, uma série de medidas foi implementada, incluindo acusações de antissemitismo contra universidades, ameaças de corte de verbas e restrições à concessão de vistos estudantis — algumas delas posteriormente revogadas pela Justiça americana.

Autocensura e Medo em alta

Em relatos exclusivos ao g1, diversos alunos afirmaram ter apagado perfis em redes sociais, revisado postagens antigas e evitado atividades extracurriculares que pudessem chamar atenção das autoridades. Alguns chegaram a desistir de visitar seus países de origem durante as férias com receio de serem impedidos de retornar aos EUA.

“Eu ia ontem visitar minha família, mas cancelei a passagem para o Brasil”, revela Núbia*. “Hoje, meu status é legal, mas amanhã talvez eu não possa mais ficar nos EUA. A orientação que recebi foi a de não sair do país, a não ser em urgências.”

Outro exemplo é Carlos*, pesquisador-visitante em Harvard, que levou seus pertences mais importantes para o Brasil durante sua última visita. “Subi no avião sem saber se iria voltar aos Estados Unidos”, conta ele, referindo-se a uma viagem recente para Oxford, onde defenderia sua tese de doutorado. “Não faço qualquer comentário sobre política americana nas redes e já revi tudo o que postei para ver se falei algo de Israel. Também saí de grupos de Whatsapp em que meus amigos discutiam política.”

O clima de paranoia é alimentado por episódios como a prisão da aluna turca Rumeysa Ozturk, detida por 45 dias após manifestar apoio aos palestinos. O caso deixou a comunidade acadêmica ainda mais assustada. “Quando algo assim acontece, todo mundo fica com medo de sair de casa. Ninguém mais vai para nenhum protesto”, afirma Carlos.

Política partidária e monitoramento ideológico

Para especialistas, as ações do governo Trump fazem parte de uma estratégia partidária e ideológica. “É uma política de criar esse sentimento de medo para que os estudantes se calem. Ainda que não sejam ameaças individuais, é bom para o governo que a gente fique em silêncio”, analisa Núbia*.

Mei Ling*, aluna chinesa da Universidade de Boston, reforça essa percepção. Segundo ela, muitos estudantes perderam o visto após interações triviais com autoridades locais ou manifestações públicas em redes sociais. “Embora o governo não tenha fornecido explicações claras, observamos que muitos dos estudantes estrangeiros que perderam o visto tinham em comum algum tipo de registro com a polícia — seja uma ligação para o 911 ou uma ocorrência leve. Os que demonstraram apoio a movimentos sociais também tiveram o visto revogado.”

Ling afirma que os estudantes agora monitoram cada “curtida” e compartilhamento de posts online, com medo de que suas opiniões sejam usadas contra eles. “Qualquer manifestação inadequada pode resultar em sanções ou cancelamento de vistos.”

Impactos acadêmicos e emocionais

Além das consequências práticas, o clima de tensão também afeta diretamente o desempenho acadêmico dos alunos. “A ansiedade e o estresse aumentaram muito; não tem como não prejudicar o rendimento acadêmico”, diz Núbia*. “Não dá nem para saber se conseguirei fazer meu último ano da faculdade ou se precisarei ter um plano B e voltar ao Brasil.”

Diego Scardone, vice-presidente da Harvard Brazilian Association (HBASS), ressalta que os casos mais preocupantes envolvem alunos recém-aprovados que sequer conseguiram entrar nos EUA. “Eles comprometeram 90 mil dólares por ano para pagar a graduação, deram sinal de dois meses de aluguel em dólar, compraram passagem, mas não vão conseguir o visto? Isso é um absurdo. Estudantes estão sendo utilizados para fins políticos.”

Enquanto isso, eventos culturais organizados pela comunidade internacional, como o carnaval promovido por brasileiros em Boston, têm registrado baixa participação. “Foi uma semana depois da prisão da turca. A festa ficou totalmente vazia. Pessoal achou extremamente perigoso sair de casa”, conta Scardone.

Diante desse contexto, os estudantes estrangeiros continuam buscando formas de se proteger enquanto tentam manter suas rotinas acadêmicas. Entretanto, a sensação geral é de que seus direitos e liberdades estão cada vez mais restritos, transformando o sonho de estudar nos EUA em um verdadeiro campo minado.

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